Muitos educadores têm experimentado e reconhecido o valor de trabalhar a partir de projetos na educação infantil. São temas e pesquisas que nascem dos interesses dos pequenos, das situações do cotidiano e do olhar apurado dos professores que pegam “ganchos” nas oportunidades significativas.
No entanto, apesar da crença, muitos profissionais tem dúvidas sobre as situações que representam oportunidades frutíferas e como provocar os pequenos para construir investigação e experimentação.
Casos práticos do trabalho com projetos
Na VI Mostra Cultural 2016 – Mãos, a equipe da Escola Primeira contou muitas histórias de crianças, professores e atelieristas que mergulharam em aventuras de experimentar, descobrir, expressar e aprender.
Visitamos mostras de todos os grupos, com os percursos e produções organizados pelas professoras e atelieristas. São processos intensos, construídos e vividos por meses, narrados por meio de registros de texto, imagens e produções. A exposição revelou os temas e pesquisas mais aprofundados. Porém, é importante lembrar que estes temas não são suficientes para abrigar todo o potencial de interesse, exploração e aprendizagem das crianças. O olhar do professor para transformar os pequenos acontecimentos significativos do dia a dia em provocações complementa as possibilidades de desenvolvimento da turma. Nesta postagem apresentamos com detalhes o trabalho desenvolvido pela professora Talita Freitas e pela auxiliar Aline Oliveira, num relato que se inicia com a identificação da oportunidade.
Crianças e sapatos: uma história de conquistas
No início do ano, a nova turma de 18 meses chegava à sala da professora Talita com o calor do verão. Para lidar com a temperatura intensa e a adaptação, as saídas para o pátio foram frequentes e, a vontade de tirar os sapatos também.
Provocadas pela diversidade de calçados que entravam e saíam dos pés e por um dos pequenos que ainda não andava e ia à escola só com meias, pés e sapatos se transformaram numa questão a ser explorada.
As crianças experimentaram colocar os seus sapatos no pequeno descalço, marcavam a areia com os pés, atentos às pegadas, e trocavam os sapatos na hora de voltar para a sala. As Crocs, mais fáceis de vestir, eram logo escolhidas, não importando a quem pertencessem!
Talita percebeu, registrou e refletiu sobre esse possível caminho de pesquisa: “tem coisa aí!”, suspeitou. Testou sua hipótese convidando os pais a mandarem para a escola alguns sapatos já fora de uso e, na primeira reunião , juntos fizeram um móbile com os primeiros sapatos usados por cada pequeno – que ficaram como empréstimo.
As crianças observavam o móbile e se envolveram com a caixa de sapatos usados, que se transformou em canto permanente da sala.
A atelierista Simone Sobral Rocha também entrou na cena pedagógica. Planejou propostas para testar as marcas dos pés das crianças e dos diferentes caçados sobre uma variedade de suportes e materiais; construiu sapatos alternativos com a turma, elaborados com sucatas; fez instalações e um pendurador portátil para calçados, que acompanhou as crianças nas visitas ao pátio e ao ateliê – uma moldura simples de madeira, com barbantes pendurados para amarrar os sapatos. Finalmente, pesquisou e apresentou para as crianças obras de arte com esse tema.
Talita arriscou estratégias. Trouxe a história João e o Pé de Feijão para provocar: será que eles vão perceber a bota do gigante? Vão notar o seu tamanho avantajado? Escolheu um livro com ilustrações que pudessem sensibilizar os pequenos e… deu certo! A pesquisa das proporções começou a ocupar as crianças. Construíram uma enorme bota de gigante a partir de uma velha banheira de bebê, e a “bota da formiga”, a partir de um sapato de boneca.
As educadoras puderam registrar as conquistas das crianças e refletir sobre elas. Com isso, observaram e identificaram os campos de experiências explorados e desenvolvidos. Por sua vez, um turbilhão de aprendizagens ocupava as crianças por inteiro: corpo, cognição, cultura, identidade, interação e expressão. Tudo junto e misturado! Uma caminhada sem volta que deixa pegadas.
Perguntamos para Alice Proença, assessora pedagógica da escola, se ela via diferenças entre a mostra deste ano e a do ano passado. Alice respondeu que a escola está ampliando a autonomia dos professores na percepção e direcionamento dos projetos desenvolvidos com as turmas. Para Alice, cada profissional ganha maior consciência contando sobre o percurso que foi feito, inclusive as auxiliares. É interessante notar que, quanto mais os professores vão ganhando espaço para falar sobre os percursos, mais tomam consciência do processo. Então quanto mais relatamos, mais aprofundamos a história. Quando aprofundamos, percebemos coisas diferentes e enriquecemos a versão inicial. O mesmo ocorre com as crianças, que ao fazerem suas narrativas, mergulham cada vez mais nos projetos.
Percebemos o quanto é fundamental para a formação narrar o vivido. Quando se dá voz para todos envolvidos, mais a gente consegue olhar de um outro lugar para uma mesma história.
♦♦♦♦♦♦♦♦♦♦♦♦♦♦
PARA SABER MAIS…
A Escola Primeira fica em São Paulo, capital. Silvia Helena Mihok Fuertes é a coordenadora pedagógica e Cristina Magalhaes Castro Fernandes é a diretora. Você pode conhecer mais sobre a proposta da Escola Primeira acessando seu site.
Leia sobre esse tema nas postagens:
- Campos de experiências todos os dias!
- Planejar é preciso, como chegar ao planejamento que atenda os desejos das crianças?
- Beatles e um projeto que vai muito além das cores
- Documentação Pedagógica como aprendizagem para crianças e professores
- Protagonismo infantil em três relatos práticos
Uma excelente ideia, adorei! Vou seguir esse exemplo e buscar ter um olhar mais preciso para atender as curiosidades das crianças pensando em projetos que sejam significativos para eles.
Que riqueza de projeto revelando a sensibilidade da professora para explorar tema que surgiu das crianças! Mostrou também o valor da documentação pedagógica. Parabéns!!
Excelente! Parabéns professora Talita pelo belíssimo trabalho!